David Fonseca ao Cotonete: «O mais interessante na vida está por vir»

David Fonseca lança hoje o seu novo álbum, “Futuro Eu”, o primeiro completamente cantado em português. O tempo que tem para conversar comigo é curto, a agenda está mais que preenchida e os atrasos a meio da manhã já fazem soar os sinais de alerta. Há muito para falar, a vontade de saber mais é tanta que só se controla com a certeza de se poder aproveitar mais uns minutos na excelente companhia do músico mais tarde ou mais cedo.

Com quase duas décadas de carreira, David Fonseca sempre nos acostumou a canções em inglês. O músico leiriense, que apenas se tinha dedicado a temas em português na colaboração no projeto de homenagem a António Variações, os Humanos, agora fez um álbum inteiro, com 11 músicas novas, todas cantadas em português. ‘Futuro Eu’, ‘Hoje Eu Não Sou’ e ‘Chama-me Que Eu Vou’ são os singles já apresentados. A “culpa” foi da casa dos avós, disse-me.

David Fonseca com Daniela Azevedo nas instalações da Media Capital Rádios
David Fonseca com Daniela Azevedo nas instalações da Media Capital Rádios

O teu novo álbum, “Futuro Eu”, introduz um aspecto inovador ou uma ruptura em relação aos trabalhos que tens feito até aqui: é cantado em português. Conta-nos tudo, porquê esta decisão?
Isto aconteceu numa altura muito específica da minha vida, na qual os Silence 4 deram aqueles concertos a favor da Liga Portuguesa Contra o Cancro, e em que eu tive que voltar ao passado para os fazer. Eu lido muito mal com a nostalgia, nunca quis olhar para trás, sempre preferi, sinceramente, olhar para a frente porque acho que o mais interessante na vida está sempre por vir. Mesmo assim achei que devíamos fazer os concertos, especialmente pela razão muito pessoal que me levou a fazer aquilo e adorei. O problema pôs-se no facto de termos que ensaiar as músicas todas o que, para quem não está muito habituado a remexer no passado, obriga a equilibrar um bocadinho as coisas. Começámos os ensaios em Dezembro de 2013, às segundas, terças e quartas-feiras. Às quartas-feiras à noite eu pegava no carro e ia para a casa dos meus avós, em Peniche, onde procurava fazer uma coisa que nada tivesse a ver com aquilo que tinha acabado de fazer, ou seja, andava a ver o que conseguia fazer, alguma canção… Num desses dias digo uma frase em português que me faz sentir uma grande emoção mas eram quatro e tal da manhã e achei que cantar em português não era lá muito bom. No dia seguinte, quando fui ver o que tinha feito, percebi que aquela era, de longe, a melhor ideia. Passados oito meses tinha 40 canções. Passei meses a ir àquela casa e foi assim que o disco começou a surgir. Foi também um desafio para mim.

Musicalmente, o álbum volta a ser electrónico ou tem outras sonoridades?
Algumas coisas sim mas outras são mais acústicas. A instrumentação do disco é toda mais simples. Pela primeira vez aconteceu que, quando chegávamos à mesa de mistura, tirávamos muito mais do que acrescentávamos. Estive a gravar coisas durante semanas que não aparecem no resultado final e foi difícil para mim porque gosto de muitos instrumentos! (risos)

Os vídeos também estão a ser feitos por ti. Como está a ser a experiência?
Uma loucura! Às vezes arrependo-me de ter tido esta ideia! (risos) Alguns gosto muito de os fazer; tenho uma ideia, ponho em prática e resulta. Desta vez, a minha ideia para o ‘Chama-me Que eu Vou’, era fazer uma timeline como se fosse um Instagram em vídeo com situações diferentes e surreais. Estive mais de um mês a fazer este vídeo e arrependi-me a meio. Pensei: “Este vídeo é o mais idiota de sempre!”. Pensei isto porque filmei muitas coisas, de forma simples e caseira, mas acabou por ser dos que gosto mais… é uma explosão de situações, é muito estranho (risos).

Ainda no álbum, porquê esta capa onde apareces a segurar uma maçã?
Há quatro capas diferentes para o “Futuro Eu” porque o futuro é uma incógnita e achei que devia ter quatro hipóteses de não ser sempre a mesma pessoa. Esta, a da maçã, é muito simples: é a ligação ao Adão a trincar a maçã pela primeira vez que é o que eu faço com a língua portuguesa, é essa a analogia. É uma espécie de um pecado que eu vou cometer ao trincar esta maçã pela primeira vez para ver o que acontece.

É curioso porque, por um lado, aproveitas as redes sociais para apresentares os singles novos, mas por outro tens lançado alguns álbuns em vinil e este, ainda por cima, numa edição giríssima, em vermelho. É difícil escolher só uma abordagem, a mais techy ou a mais vintage?
Eu sou uma pessoa antiga nesse sentido. Quando comecei a fazer coisas nesta indústria, o disco ainda tinha essa forma, esse valor enquanto objecto. Ao longo do tempos foi-se perdendo esse valor, porque as pesssoas passaram a ouvir tudo em streaming, por isso, no vinil, englobo a ideia antiga de ter o objecto e ouvir a música dessa forma. E depois porque é absolutamente lindo. Estou muito orgulhoso desta edição, a capa fica especialmente bonita na edição em vinil.

No teu trabalho anterior contaste com a colaboração de Malú e de Luísa Sobral e agora surge a Márcia em ‘Deixa Ser’. Como é que surgiu esta colaboração?
Nós conhecemo-nos há algum tempo, ela é casada com um amigo meu, comecei a ir jantar lá a casa e um dia ela pergunta-me se eu não quero fazer a capa do disco dela. Eu disse que sim, desde que ela aceitasse fazer uma canção para o meu disco. Ela disse que sim e pronto, fizémos uma troca. Foi uma coisa muito simples. Gosto muito dela, genuinamente, e estas coisas têm de funcionar primeiro por aí, por uma admiração que temos por uma certa pessoa, por isso é uma sorte tê-la no disco e ainda por cima é num dos temas de que mais gosto, o ‘Deixa Ser’.

Remetendo para o antigamente, de que há pouco falávamos, estou a lembrar-me daquele hábito que dantes havia muito, o de um grupo de amigos, fazerem uma longa viagem de carro, a ouvir um álbum de uma ponta à outra. Se isso acontecer, com o “Futuro Eu” por banda sonora, qual era o destino para onde gostavas que esse grupo de amigos se dirigisse?
Tinha que ser um destino de mar. Como o disco foi todo feito em Peniche, com o mar sempre presente, a ligação com esse universo do mar e da costa tinha que estar presente. Mas tinha que ser uma viagem rumo a um mar revolto, com os elementos da natureza à nossa volta sempre contra nós. Isso põe-nos no lugar e faz-nos entender melhor onde estamos, de forma mais realista, com os pés assentes na terra.

Trabalho feito por Daniela Azevedo para o extinto site do grupo Media Capital Rádios: Cotonete – Música e Rádios Online

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