José Camilo prepara segundo álbum: «Estava com vontade de escrever canções mais sujas, rápidas e pesadas»

José Camilo está a trabalhar no segundo álbum e já tem single de apresentação

‘Sangram os Dias’ é o single de avanço para o álbum “Obra Camiliana”, o segundo trabalho de José Camilo.

Numa nova fase musical, o cantor sentiu necessidade de compor música mais pesada, «abrasiva e suja», o que resulta num segundo álbum com uma sonoridade mais definida, pelos caminhos do punk rock ou alternativo em português.

Na produção do disco novo, ainda sem data de lançamento prevista, está Fernando Matias que já trabalhou com os Linda Martini e Quartet of Whoah. O sucessor de “24 Horas no Subúrbio”, de 2013, vai assentar num rock mais duro, onde se vão ouvir guitarras distorcidas e uma bateria «inspirada em Dave Grohl e na sua forma única e emocionante de tocar».

O vídeo, mais abaixo, tem o dedo da realizadora Filipa Aires mas o guião foi escrito pelo próprio José Camilo, em conjunto com Rui Alves de Sousa e Raquel Santos Silva. As imagens foram captadas no velho miradouro panorâmico de Monsanto, em Lisboa, por entre ruínas e poças de água, num ambiente que privilegia a mensagem que o músico quer passar. Ryan Adams, Pavement ou Sonic Youth são alguns dos nomes que o inspiraram e que partilhou nesta conversa.

Daniela Azevedo – José Camilo, já estás a trabalhar no segundo álbum, “Obra Camiliana”. Este novo trabalho constitui uma rutura com o de estreia? Porquê?
José Camilo – Não gosto de ver o álbum que estou a acabar neste momento como uma rutura com o primeiro, prefiro dizer que é uma abordagem diferente. Há vários fatores para essa diferença. O primeiro está relacionado com a própria natureza do “24 Horas no Subúrbio”. Nesse disco propus-me a retratar um lado obscuro de um local específico. Sendo esse lugar o sítio onde cresci, é natural que, misturada com essa obscuridade, haja também alguma melancolia na música. Ao tocá-lo ao vivo, com a minha banda, as canções foram ficando mais pesadas e rápidas e quando parti para este disco estava com vontade de escrever canções mais sujas, rápidas e pesadas. Se o primeiro era um disco negro e melancólico, este será um disco de raiva. Contudo, não será só isso, haverá espaço para mais, mas terão de esperar para ouvir.

DA – Houve alguma “lição aprendida” com o primeiro álbum que agora queiras mudar?
JC – Quando acabei o primeiro disco senti que tinha chegado ao fim de uma etapa e que o próximo seria diferente. Não quero fazer sempre o mesmo disco, o desafio está precisamente em ir fazendo coisas distintas. Não houve uma grande lição, mas é claro que vamos sempre sugando informação pelo caminho. Aprendi algumas coisas técnicas de como gravar um disco, como aproveitar aquilo que poderá ter interesse na minha música, mas são aspetos muito específicos que não acredito que valha a pena discuti-los aqui.

DA – Quem são os teus grandes ídolos na música?
JC – Fico sempre à rasca quando me perguntam isso. Na verdade ouço muita música e muita dela não soa nada parecido com aquilo que faço. Quando era adolescente ouvia muito rock mais pesado, desde o hardcore ao grunge, passando pelo punk e algum rock alternativo. Fui a muitos concertos em que andava no mosh e isso foi importante, sobretudo porque me deu aquela vontade de fazer música. Era algo vibrante e eu queria fazer parte daquilo. Depois passei pela fase de ouvir muitos cantautores desde os portugueses, como o Sérgio Godinho ou o Jorge Palma, até aos estrangeiros como o Leonard Cohen ou o Bob Dylan. E aqui tenho de destacar o Dylan. Só comecei a ouvir o Dylan decentemente na faculdade, mas quando ouvi, passei-me! Ninguém escreve como ele, ninguém canta como ele nem ninguém compõe como ele. Ele é único e isso é difícil de conseguir. Se queres que te diga alguém que eu admiro é ele, certamente. Nunca quis fazer música na linha do Dylan, não se trata disso, trata-se de valorizar um tipo que criou uma identidade musical muito própria e isso é incrível. Quanto a ídolos no sentido de olhar para eles para me ajudarem a compor não consigo fazer nenhuma lista, é uma mistura de influências.

DA – Dizes-te inspirado por Dave Grohl. Qual a característica dele que gostavas de perpetuar na tua música?
JC – Não me sinto propriamente inspirado pelo Dave Ghrol mas sim por uma forma de tocar bateria. Quando estava a compor as canções para o “Obra Camiliana” escutava uma bateria dentro da minha cabeça, isto logo nas primeiras maquetas, quando estava apenas a gravar ideias para um telemóvel em casa. Quando fui para estúdio comecei por compor a bateria numa drum machine antes de chamar o baterista. Estava a fazer isso com a ajuda do meu produtor, o Fernando Matias, e reparámos que a bateria que estávamos a compor estava na linha da forma de tocar do Dave Grohl. Conheço muito bem todos os discos dos Nirvana e o “Songs For the Deaf”, dos Queens of the Stone Age, onde o Dave Grohl tocou bateria, isso deve-me ter influenciado. No entanto, não é por ser o Dave Grohl mas sim por achar que aquele estilo encaixava nas minhas músicas.

José Camilo está a trabalhar no segundo álbum e já tem single de apresentação
José Camilo está a trabalhar no segundo álbum e já tem single de apresentação

DA – As letras são da tua autoria? Parece haver uma certa revolta, uma espécie de desabafo generalizado sobre alguns aspetos menos positivos da sociedade. É assim?
JC – Sim, todas as letras e músicas são da minha autoria. Daí te estar explicar como compunha a bateria. Quando chamo os músicos já está tudo preparado para eles tocarem, vou-lhes dizendo o que quero e como quero fazer. Aliás, na minha página de Facebook a expressão que escolhi para me definir é “escritor de canções” e é assim que me vejo. Essa é a minha função: escrever as letras, compor as músicas e fazer um casamento entre as duas. No que toca às letras tudo tem a ver com o que me proponho fazer. Tenho o hábito da escrita, não escrevo só letras de canções, já escrevi pequenas peças infantis, por exemplo. Mesmo nas letras também já escrevi para música infantil, por isso tenho escrito para diversos universos. O que se passa com os meus discos é que estou a tentar escrever para o universo que imaginei para o álbum. No primeiro estava a escrever sobre o lado obscuro de viver num determinado sítio, escrevia com isso em mente. No segundo achei que o que tinha a dizer sobre os subúrbios já tinha dito e quis escrever de uma perspetiva mais abrangente. Quis escrever para que qualquer tipo que entenda português se possa relacionar com o que estou a dizer. Paradoxalmente, cheguei à conclusão que para o fazer teria de criar de uma forma mais pessoal. Se eu cantar sobre as minhas emoções certamente haverá um tipo no Minho e outro no Algarve que já sentiu o mesmo. Terás storytelling como tinhas na canção ‘Imperatriz das Flores’ do primeiro disco, mas também terás canções de desamor. Como é um disco com um ambiente de raiva, é natural que nas letras exista a tal revolta. Quando tenho de escrever para outros universos, por razões profissionais, tenho que respeitar o que me estão a pedir. Quando escrevo os meus discos escrevo-os para mim e posso abordar o que quiser. Por alguma razão, que não sei explicar, escolho sempre abordar o lado difícil da existência humana.

DA – O local escolhido para filmar o vídeo ajuda a passar essa mensagem?
JC – Claro que sim. Penso sempre muito em como vou fazer os vídeos. Nos dois primeiros, além de escrever o storyline, estive envolvido na realização. Neste o mérito não é meu, mas sim da Filipa Aires que o realizou. Cheguei à Filipa com um storyline já escrito, mas foi ela que escolheu o local. Enviou-me umas fotos e eu alinhei logo. Tem um ar decadente mas também muito belo e era isso que eu estava à procura.

DA – Os teus espetáculos são como no vídeo? One man show?
JC – Não. Era impossível recriar o tipo de ambientes que gravo nos discos estando sozinho em palco. Tenho um grupo que me acompanha nessa função, chamam-se Os Cúmplices. É isso que eles são, meus cúmplices, meus comparsas. São o Tomás Borralho, na bateria, a Cláudia Correia, nas teclas, o Luís Pereira, na guitarra, e o Pedro Sousa, no baixo. O ofício de composição e gravação é um trabalho solitário, chamo-os apenas para me ajudarem no que não consigo fazer por mim, mas ao vivo estamos os cinco a tocar. Se a minha tarefa é escrever letras, compor músicas e gravar, a deles é transformar o que eu criei num espetáculo ao vivo.

DA – Onde é que podemos ir acompanhando os teus próximos concertos?
JC – Agora estamos num limbo porque os concertos dependerão da altura que sair o disco, que ainda não está decidida. Mas podem acompanhar tudo em https://www.facebook.com/JoseCamilomusico/

Daniela Azevedo

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