Alexandre Vaz, Head of Mercedes-Benz Digital Hub Portugal: «Nunca houve uma altura tão boa para trabalharmos em tecnologia como agora»

A Mercedes-Benz inaugurou o primeiro centro de competências digitais ao nível mundial em Lisboa

A Mercedes-Benz inaugurou há cerca de um mês o primeiro centro de competências digitais ao nível mundial (Digital Delivery Hub) em Lisboa e está a recrutar jovens talentos na área da programação.

O novo Digital Delivery Hub, de acordo com a Mercedes Benz, será uma peça essencial da estratégia da empresa, ao acelerar a atual fase de transição da empresa que, no ano passado, vendeu 20 mil automóveis em Portugal, para passar a ser um fornecedor líder de serviços de mobilidade premium já que, para a empresa, construir carros já não é suficiente num futuro onde cada pessoa com um smartphone pode vir a ser um potencial cliente Mercedes.

Depois da abertura em 2016 do Network Assistance Center, este é o segundo intelligence center a ser criado em Portugal pela Mercedes-Benz que já está, contudo, a funcionar há dois meses no espaço de cowork Second Home, no Cais do Sodré. Foi precisamente aí que Alexandre Vaz, Head of Mercedes-Benz Digital Hub Portugal, me recebeu para explicar melhor como pretendem criar produtos de marketing digital e soluções tecnológicas para todo o mundo a partir de Lisboa.

O novo Digital Delivery Hub será uma peça essencial da estratégia da empresa
O novo Digital Delivery Hub será uma peça essencial da estratégia da empresa

Daniela Azevedo – Como é vai, realmente, funcionar este hub tecnológico da Daimler?
Alexandre Vaz – Estamos enquadrados na área de marketing digital e o nosso objetivo é desenvolver todas as plataformas da Mercedes, da Smart, ou o que for, que não estão dentro do carro mas que se podem ligar ao carro. Podem ser todos os sites, todas as apps. O objetivo da Mercedes é, por exemplo, abrir as portas do carro remotamente e até há uma app que estaciona o carro sozinho. A ideia é começar a trazer para cá todos estes projetos. O primeiro é o One Web – o novo website da Mercedes. Até agora havia um site mais antigo, que tem que ser refeito e com uma comunicação mais uniforme, e à medida que vamos contratando vamos trazendo partes desse puzzle para Portugal. O objetivo do hub é trazer skills que estão fora para Portugal e começar a refazer. O website é muito urgente porque a maneira como hoje em dia compramos um automóvel é diferente da que se fazia há dez anos. Antigamente, para comprar um automóvel, a pessoa ia em média 5 a 7 vezes a um stand. Hoje em dia a estatística diz que é um dia. A decisão da compra do automóvel é agora feita online, só vamos ao stand assinar o contrato. Toda a experiência que damos aos potenciais clientes tem de ser online.

DA – Já não se fazem test drives?
AV – Ainda há test drives mas também já são geridos online; marcamos online e só chegamos ao local apenas para experimentar o carro. É preciso é que o cliente tenha uma boa experiência online, temos que garantir que tudo funciona até se chegar ao stand.

DA – Desde sempre que me lembro de a Mercedes ser uma marca cujo prestígio passa de geração em geração e, durante muito tempo, a imagem de marca mais forte da Mercedes era a da segurança. E no online? Como vão garantir a total segurança dessas aplicações da marca?
AV – Essa imagem continua a ser muito forte. Do ponto de vista da tecnologia, a Mercedes não está nada atrás da Tesla mas, é verdade, tem uma imagem e uma reputação em termos de segurança que não lhe permite ir para o mercado com o à vontade que a Tesla tem, porque beneficia do facto de ser um player de inovação em tecnologia. Quando surge uma notícia menos positiva sobre a Tesla, acho que as pessoas as encaram com uma maior naturalidade porque são inovadores e a Mercedes não pode fazer isto. Quando a Mercedes lançar estes carros simplesmente não pode haver falhas porque tem esta imagem de que, em termos de segurança, é uma marca que não falha. É evidente que a segurança também está nas prioridades deste hub.

DA – Há alguns dias conheci a professora portuguesa Manuela Veloso, da americana Carnegie Mellon University, que dedicou toda a sua vida ao estudo e conceção de robôs, e fiquei com a ideia de que os carros autónomos não estão assim tão próximos da realidade. É assim mesmo?
AV – Sim, acho que ainda há caminho a percorrer, embora ache que esse caminho não é tanto tecnológico mas sim do ponto de vista da legislação e da preparação das estradas. A autonomia de um automóvel é composta por vários níveis. O primeiro passo talvez seja a existência de uma autoestrada dedicada ou podemos começar pelos camiões e o desafio talvez possa ser atravessar os Estados Unidos de uma ponta a outra.

DA – Seria mítico fazer esse teste na Route 66… [risos]
AV – Seria o mais fácil, senão vejamos: temos uma estrada praticamente direita, com tráfego muito controlado. Haverá uma altura em que vamos ter que pensar como é que os carros autónomos vão “conviver” com os carros não autónomos. Tudo isso ainda vai tomar um longo espaço temporal.

DA – Na sua opinião vamos, então, assistir a uma fase de transição sem que os carros autónomos nos sejam impostos de um momento para outro?
AV – Acho que tem de haver essa transição, aliás já existe de certa forma, ainda que o condutor continue sentado e com as mãos no volante. Essa transição também deverá ser diferente em várias partes do mundo. Haverá países que vão começar a testá-los em autoestradas, outros vão testar em caminhos mais curtos… e tudo vai depender muito da tecnologia que, às vezes, tem avanços que não conseguimos prever.

DA – Pois… até no filme “Regresso ao Futuro”, da nossa infância, vimos esse cenário… [risos]
AV – Claro, é verdade, já nos anos 80 havia esse cenário! [risos] E agora, se analisarmos bem, vemos que muitos carros já travam sozinhos, se virem um obstáculo à frente, e nem é preciso serem de gama alta. Projeções nos vidros, espelhos retrovisores que fazem avisos… já é tudo tão natural…

DA – O que vai mudar na experiência do cliente Mercedes?
AV – Quando temos um carro autónomo, tem que se repensar o que se faz dentro do próprio carro. Ora, se ele é autónomo, porque é que os lugares têm de estar virados para a frente? No fundo, o carro vai tornar-se numa sala de estar e o que queremos dar ao cliente é a experiência de, por exemplo, numa viagem de duas horas, termos de lhe proporcionar entretenimento e possibilidade de trabalho. Vai haver uma evolução nestes dois caminhos: se é o nosso próprio carro e vamos a caminho das férias se calhar vamos querer algo divertido para fazer; se estamos no carro da empresa, temos que garantir, por exemplo, que vai ser possível estabelecer várias conversas pelas plataformas online. Tudo isso vai mudar.

DA – Qual vai ser o sistema operativo que a Daimler – Mercedes vai usar? iOS ou Windows?
AV – [risos] Não sei, não sei… não posso comentar… A Mercedes chegou a ter um aspeto de carro para uma geração com mais idade mas quando olhamos para o design de hoje em dia… temos o melhor design do mercado nesta altura. E os resultados mostram-no: há 50 meses que a empresa não para de crescer. Nas várias gamas acho que, nesta altura, não há carros mais bonitos que os da Mercedes.Sobre o sistema operativo… veremos…

DA – Como é estar à frente deste hub criativo?
AV – O hub criativo é uma oportunidade muito gira, nunca houve uma altura tão boa para trabalharmos em tecnologia como agora. As coisas vão mudar e podermos fazer parte dessa mudança, a par com uma das mais poderosas marcas do mundo, e poder fazê-lo em Portugal, é excelente. A conquista de trazermos isto para Portugal prendeu-se com o facto de termos cá mão de obra muito boa e flexível, a facilidade que houve por parte dos vários organismos e o demonstrar que havia boa vontade em todo o lado. A decisão inicial apontava para Barcelona e depois chegou a falar-se de Londres, por isso, foi uma conquista enorme e acho que vamos tornar este hub muito grande. Do ponto de vista de carreira não podia desejar mais.

 

Daniela Azevedo

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