Decorreu neste fim de semana de 18 a 20 de setembro, no Pavilhão do Conhecimento – Centro Ciência Viva, a segunda edição da Maker Faire Lisboa. Parte da minha surpresa começa aqui, na questão da “segunda edição”. E surpresa porque, num dos meus grupos de amigos, já tinha ouvido falar tanto, mas tanto da Maker Faire, que estava capaz de pressionar o Sapo, enquanto organizador, a fazer uma espécie de “apresentação para a imprensa” de propósito só para mim para não passar nem mais uma semana sem ver o que era a dita Maker Faire. E tinha razões para estar tão curiosa.
Durante três dias ali acorreram, segundo dados oficiais, mais de 14 mil visitantes, que não quiseram perder a oportunidade de ver, mexer, experimentar e conversar com a centena de makers que ali esteve, a custo mas com satisfação, três dias seguidos. A Maker Faire original foi organizada em San Mateo, na Califórnia, e este ano completará uma década de existência. A de Lisboa lá chegará, tenho a certeza.
A Maker Faire não pode descolar-se da exposição permanente, no piso inferior, que mostra as várias vertentes das perturbações psicológicas do Ser Humano. Para recordar, é possível, por exemplo, ver como era um consultório de Freud em miniatura, perceber o impacto que um doente com depressão pode ter na vida de toda a família ou, ainda, experimentar um esquizofónio. O que é? Não sei, porque estavam crianças a usá-lo quando por lá passei, mas a descrição do objeto (vamos imaginar uns auscultadores grandes aos quais estão acoplados uns funis com a parte larga virada para fora) prometia trazer-nos uma alteração da perceção da realidade. Com este nome quer-me parecer que não estaria muito longe de um ambiente de redação de jornal a minutos do fecho da edição semanal mas espero poder ter uns na cabeça noutra oportunidade (se me virem a fazer figuras estranhas ajam com naturalidade, pode ser?).
Subindo ao primeiro piso começamos a perceber o porquê desta feira, de âmbito e fama internacionais, estar a ganhar terreno entre nós. Desde um stand que imprime em 3D corações e cubos que giram sobre engrenagens e rodas tão maleáveis como esponjas do banho, uma mão mecânica da Lego feita por uma criança de quatro anos e programada por uma de 13, e o simulador de condução em Marte, o Mars Rover, a primeira reação é olhar para o relógio e perceber quanto tempo tenho para me inteirar disto tudo. Foi inocente da minha parte acreditar que a noite de sexta chegava.
«Estás prestes a conduzir um Rover em Marte. Isto funciona assim: nós construímos um Rover, uma sonda semelhante às Spirit e Opportunity que a NASA enviou para Marte. Trata-se de um Rover semi-autónomo mas que obedece a comandos enviados da Terra. No entanto, como Marte chega a estar a 400 milhões de quilómetros, um sinal rádio, mesmo à velocidade da luz, demora 20 minutos a chegar até Marte e outros 20 para conseguirmos ver o resultado. Essa limitação faz com que não seja possível pilotar o Rover diretamente e obriga ao desafio que simulamos aqui de planear uma rota, construir sequências de comandos para conseguir deslocar o Rover até ao local desejado, nem sempre com o sucesso esperado, aliás como acontece à NASA.», explicava-me o Basílio Vieira. Experimentei e gostei. «Tens um plano, assim não vale!», disse-me. Não tinha mas se pareceu que sim já é meio caminho andado para me sentir “em casa”. «Como é que isto funciona? Então, isto são dois sensores, e aqui está um Raspberry», dizia o Luís Correia, do OOZ Labs. Juro, de pés juntinhos, que ele descreveu tudo o que estava dentro do Rover. Tudo. Mas nunca gostei de me pronunciar sobre aquilo que desconheço, portanto, paramos a minha descrição nos sensores e no Raspberry (que não é uma amora).

É preciso inteligência, criatividade e empenho no engenho em doses massivas, digo-vos eu que acompanhei de perto este projeto em particular, que são pagos com os reconhecimentos que, no final, chegaram em forma de Maker of Merit Awards. «Amanhã não me mexo», dizem, com a certeza de que, no final, só as pernas é que não hão-de responder à chamada porque a cabeça já fervilha de ideias para o ano que vem.
A cada lado para onde me virava, mais e mais informação interessante chegava. «Preciso de um bloco. Não, esquece, não sejas tonta isto é a Maker Faire! Preciso de um smartphone, um gravador, um iPad, ai, já contaste tudo e eu não tomei notas!», afligi-me. Não é fácil mas é muito bom.
Quanto aos stands que estavam na rua, as surpresas continuaram. Com brinquedos artesanais mas cheios de conceitos de Física por detrás, uma artesã dos tempos modernos com telas impressas em serigrafia, canetas para fazer “arte” em 3D, uma consola “Ultimate Arcade” ali à disposição e sem serem necessárias moedas (dei uma coça aos bonecos maus, some things never change…), todos os “fazedores” se mostraram afáveis ao falarem sobre os seus inventos, todos quiseram trocar contactos e, mais tempo houvesse, todos estavam disponíveis para que os pudesse experimentar.

Ainda consegui assistir a uma batalha de robôs. «Este vai reformar-se agora mas é o 11.º mais valente no ranking mundial», contava um dos responsáveis por comandar os mauzões. Ranking mundial? Mas ele é uma espécie de incrível Hulk de aço maciço? É. Assistir a uma batalha de robôs coloca-nos perante uma discussão que, acredito, ainda virá a alimentar muitos fóruns, debates e conferências. Se, por um lado, fiquei logo de olhinhos a brilhar na expectativa de estar a testemunhar o surgimento da indústria de substitutos para as touradas, lutas de cães e de galos do futuro, por outro, apercebemo-nos que podemos estar a apadrinhar os nossos mais mortíferos inimigos. «Isso não vai acontecer. Pelo menos não nas nossas vidas», desabafava o rapaz. Não sei se ria ou chore. É que isto com o avançar da idade começo a ter afeição por gaiatos e a ideia de se poderem cruzar com o monstro-da-caterpillar-rotativa-de-16-gigas não me dá grande vontade de ter uma mãozita para agarrar no caminho para a escola…
Se foste daqueles miúdos que só tinha máquina de calcular pelo prazer de a desmontar em pedacinhos e testar métodos alternativos de funcionamento, aqui está um dos lugares que tens de conquistar no próximo ano. Se tiveste um grupo de amigos com quem te divertias à volta de engenhocas que, não raras vezes, davam para o torto, está na altura de recuperares essa piada da vida. Se estás mesmo só em casa porque “já não dá para a praia” então vem que não pagas nada. Não faças como eu que já perdi um ano disto.
Sinal – : A sinalética no local. A disposição dos espaços não é muito intuitiva e não faz muito sentido que a entrada seja pelo lugar mais escuro e recôndito do Pavilhão quando os focos de luz estão todos a apontar para as baias intransponíveis;
Sinal + : A simpatia e atenção dos voluntários;
Sinal ++ : À entrada o jovem a quem me dirigi com o registo da pré-inscrição para obter a pulseira de acesso: «O quê? Em papel? Mas só tem assim? E agora?». Vá, fundamentalistas do iPhone, riam-se que eu deixo.