Ana Carvalho, Professora associada com agregação no Instituto de Bioética na Universidade Católica Portuguesa, nota que o progresso tecnológico se tornou sinónimo de prosperidade económica que ficou fortemente afetada devido à pandemia. “Temos que reinventar esta noção de progresso. Vivemos em simultâneo a maior utopia e distopia – os tecnofílicos acham que a tecnologia vai resolver tudo; os tecnofóbicos receiam que a tecnologia venha a representar um apocalipse. O problema somos nós; não são os sistemas operativos”, afirma a professora.
Tecnologias na Saúde em tempos de COVID-19
Um terço da população mundial está em confinamento obrigatório e isto terá consequências inimagináveis para todos.
Esta medida de aplanar a curva relativamente às questões de saúde teve um rasto de destruição social e económica. Tal como num tsunami, salvaram-se muitas vidas, mas muitas outras sentirão a destruição desta onda gigante. “As consequências económicas não afetarão as populações de forma igual. As gerações mais jovens confinaram-se em respeito pelas gerações mais velhas, mas sabemos que as mais afetadas pela pobreza vão ser, precisamente, essas gerações mais jovens. Se a pobreza já era assustadora, esta pandemia vai deixar um rasto terrível nesta classe geracional mais jovem” – é esta a leitura feita por Ana Carvalho.
Luís Antunes, Data Protection Officer (DPO) na Comissão Nacional de Proteção de Dados (CNPD), Professor no Departamento de Ciência de Computadores na Faculdade de Ciências da Universidade do Porto (DCC – FCUP) e Diretor do Centro de Competências de Cibersegurança e Privacidade (C3P) na mesma Faculdade, também se referiu aos impactos das tecnologias digitais na crise pandémica, lembrando que as mesmas representam “por desenho” escolhas políticas e éticas de quem as está a usar e a um determinado custo (que dados seus deu em troca).
O Regulamento Geral de Proteção de Dados (RGPD) deveria alavancar o tratamento de dados e construir a confiança do cidadão, ao invés de ser visto como um entrave ao desenvolvimento económico, à medida que caminhamos para uma economia de dados pessoais: qualquer informação de qualquer natureza ou em qualquer suporte.
Luís Antunes explicou a diferença entre dados anonimizados e pseudo anonimizados. Nos primeiros, não há qualquer ligação entre os dados disponíveis; são dados pessoais soltos sem link causa-efeito. Os dados anonimizados são dados pessoais convertidos em dados não identificáveis, cujo processo de anonimização não pode ser reversível, ou seja, uma vez dissociados entre si, não pode haver a possibilidade de agrupá-los novamente e identificar a quem pertencem.
O PIA – Privacy Impact Assessment – deve ter uma identificação clara de todos os atores e interações, de modo a que o DPO seja capaz de identificar claramente a sensibilidade das informações trocadas, bem como todas as preocupações relacionadas à privacidade. Ao analisar um PIA, o DPO deve ser capaz de verificar todos os riscos identificados e avaliar se os controlos correspondentes são adequados para a minimização dos riscos. A metodologia PIA deve ser baseada numa revisão crítica dos métodos e procedimentos existentes.
Sara Carrasqueiro, Vogal do Conselho Diretivo da Agência para a Modernização Administrativa (AMA) e Professora no Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa, partilhou a sua experiência na Administração Pública em relação ao papel da ética na tecnologia.
A COVID-19 trouxe isolamento social, doença, morte, uma nova crise económica e a oportunidade de progresso, de melhorar a prestação de serviços a cidadãos e empresas, ou seja, trouxe a oportunidade para a massificação das tecnologias, num contexto de inovação adaptativa (ambiente disruptivo, imprevisível). Nesta fase, houve um “salto quântico” na forma como a Administração Pública (AP) se relaciona com o cidadão. “Não parou, continuou a trabalhar remotamente, e fomos o país no qual se identificaram mais iniciativas neste âmbito da Administração Pública, mas também iniciativas civis que tiveram impacto na resposta do setor. Houve grande oportunidade para as tecnologias avançarem e trazerem soluções novas e a adoção rápida de outras que já existiam. Não há oportunidade sem risco – a mudança acarreta também sempre algum risco e, com isto, verificou-se um afrouxamento de normas”, salienta Sara Carrasqueiro.
O futuro passa por continuar a experimentar e desafiar as regras atuais, sempre assegurando o valor público do Governo Digital com o foco nos cidadãos e empresas, garantido a acessibilidade e inclusão, abertura e transparência, privilegiando os canais digitais. Qualidade, interoperabilidade e segurança, deverão estar sempre na base da inovação para o uso responsável das tecnologias. “É preciso continuar a partilhar boas práticas; fazemos parte do grupo dos 10 países mais avançados do ponto de vista digital e queremos orientar terceiros”, conclui Sara Carrasqueiro.
Estas são apenas algumas das conclusões que estão disponíveis neste documento.
Daniela Azevedo para a APDSI