A expressão “dar espectáculo” tem uma nova definição: The Gift

The Gift - Foto: Vanessa Krithinas

Se este texto fosse apenas uma linha de Twitter seria algo como: “Quando a amálgama de coisas boas é tanta que não se sabe por onde começar”. As hashtags? #incrivel #20anos #osmaiores #fenomenal #venhammais20.

Foi com os Gift que fechei o meu ano de concertos. Mais um ano em que é tarefa difícil escolher os melhores mas que estão espalhados aqui pelo site. Faltava este. Já nem me lembrava que os Gift soavam assim tão bem em 1998, só para dar uma data.

Celebrar 20 anos de Gift tem muito que se lhe diga mas a noite de hoje no Meo Arena, em Lisboa, seguramente contou as melhores partes e as que vamos querer recordar por muito mais tempo. 20 canções (antes do encore), 20 minutos em contagem decrescente antes do concerto começar e outros paralelismos estabelecidos entre a publicidade patrocinadora e a efeméride que marca o atual momento de carreira da banda de Alcobaça. Um narrador começa, em voz e texto teatrais, a relatar a história do grupo, apenas com a sua imagem a ser projectada em vídeo para, no final, termos direito a vê-lo ao vivo e a cores.

Em palco, tudo começou com o novo tema ‘Clássico’ – que promete vir a tornar-se num – que foi interpretado pela vocalista Sónia Tavares enquanto era içada e começava a sobrevoar o muito público presente, numa viagem para um noite de quase três horas de música que nos vai ficar cravada na pele de tão intensa foi. Houve confetti logo no início, portanto estava feito o convite para se cantar “parabéns a você”. Numa noite de celebração e completo entendimento com o público, a banda apresentou um alinhamento que passou pelos singles mais marcantes de um total de cinco álbuns.

Depois da surpresa inicial, eis que o palco fica imediatamente escuro, a simular um espaço pequeno e apertado com a banda toda em círculo. A canção que se ouviu foi ‘Laura’, repescada lá mesmo atrás do tempo da demo tape “Digital Atmosphere”, de quando os Gift não passavam de um sonho sonhado a partir de uma janela com vista para a cidade do mosteiro Património da Humanidade. Depois do momento, Sónia Tavares diz que a intenção da decoração foi simular o sótão onde tudo começou e começa a desdobrar-se em simpáticos e sinceros agradecimentos.

Seguindo uma ordem cronológica, surge o álbum “Vinyl” com as canções ‘Dream With Someone Else’s Dream’, ‘Truth’, ‘Changes’, ‘How The End… Always End’ e ‘OK! Do You Want Something Simple?’ já com gente a aplaudir de pé. Este arranque de festa fez-se acompanhada por um septeto de cordas que só veio engrandecer ainda mais a já fortíssima presença de palco que o grupo tem e, naturalmente, a única Sónia Tavares. Facilmente a cantora podia deslumbrar-se com a evidência de que é a rainha da festa mas não; a parceira de vida de Fernando Ribeiro, vocalista dos Moonspell, optou por ser a própria a abrir-nos os portões do seu castelo e a espalhar carpetes fofas pelas muitas divisões por onde nos levou a passear.

‘Senschut’, do mais recente “Primavera”, vem destapar uma Sónia Tavares completamente entregue a uma personagem controversa: tem tanto de feminino: nas flores, no cabelo, na maquilhagem, na forma graciosa como dança, como de masculino, no registo vocal, nas poses que assume enquanto se dá toda, na força de rocha que nos transmite.

‘Butterfly’, do álbum de 2001, “Film”, é apresentada pelo teclista Nuno Gonçalves como sendo a sua predilecta do disco. Sónia Tavares, enquanto se debate com uma das várias saias de tule que usou durante a noite, vai brincado com um dos técnicos que a ajuda: «Tenho as piores damas de companhia de sempre; nem sabem apertar um espartilho!». ‘Meaning of Life’ e ‘Primavera’, do álbum homónimo, de 2012, são um arraso e a cantora continua a dar o corpo ao manifesto sem mostrar sinais de cansaço. Ao acrescentar mais uma camada ao vestido, a de tule amarelo, facilmente se percebe que vem aí “Explode”, de 2011, através de ‘Made For You’ e ‘RGB’, acompanhados do pedido: «É para dançar, OK?».

Não queremos, nem nos apercebemos do adiantado da hora mas o espectáculo atinge os picos pré-final com a entrada de Luna, o transformista que aparece no vídeo e ali cantou ‘Driving You Slow’, além de ‘The Singles’ ter visto o teclista a cantar também, completamente seduzido pelo frenesi das luzes e da música, a atravessar o palco de ponta a ponta.

Como se já não tivesse havido surpresas por demais, o encore começa como começou o concerto: com Sónia Tavares, içada, a voar por cima do público que estava nas filas mais à frente, mas desta vez o número de loucura ainda foi maior; enquanto a cantora se vai chegado para o meio do recinto, Nuno Gonçalves vai descendo do tecto até ao chão sentado ao piano, também ele numa estrutura suspensa, até que os dois se encontram, já em solo firme, com uma cumplicidade arrepiante com Sónia a contar ao amigo de longa data o lado negro do fim de uma relação em ‘Fácil de Entender’. Os dois ainda ali ficam no micro-palco ao meio da sala para homenagearem Frank Sinatra, que no passado dia 12 voltou a ser notícia pelo centenário do seu nascimento. Sónia Tavares e a sua colossal voz só vieram confirmar a sua faceta cinematográfica, tal como o próprio Sinatra tinha. E todos se despedem com ‘Music’ a fazer-nos desejar que a dita seja aquilo que os Gift nos vão dar por muitos e bons anos.

Por esta hora é provável que os Gift ainda estejam a dar autógrafos. É que a promessa foi deixada no fim: «Estamos ali em cima a dar autógrafos e só vamos embora quando também o último de vocês sair». Bom, deve ser isto o Natal a acontecer.

The Gift - Foto: Vanessa Krithinas
Sónia Tavares no concerto de aniversário dos Gift, no MEO Arena, em Lisboa, a 19 de dezembro, fotografados por Vanessa Krithinas

Trabalho feito por Daniela Azevedo para o extinto site do grupo Media Capital Rádios: Cotonete – Música e Rádios Online

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